A popularização da Inteligência Artificial e os desafios do uso responsável
- Saimon Ferreira

- 30 de out.
- 3 min de leitura
Professor de comunicação na Universidade dos Açores e pesquisador do tema, santiaguense Fábio Giacomelli, analisa a popularização da Inteligência Artificial e alerta: “A tecnologia deve ampliar nossas capacidades, não substituir o pensamento humano”

Nos últimos 18 meses, assistimos a uma expansão sem precedentes dos modelos de linguagem de larga escala, os chamados LLM’s (Large Language Models), como ChatGPT, Gemini e Perplexity.
Essas ferramentas transformaram a forma como interagimos com a informação, o conhecimento e até com o próprio ato de pensar. Tornaram-se acessíveis, intuitivas e capazes de gerar textos, imagens, vídeos e códigos em segundos. No entanto, essa popularização exige um olhar crítico e responsável.
É importante compreender que tudo o que esses modelos produzem tem base em dados e dados, por sua vez, são sempre fruto de escolhas humanas. Os modelos gratuitos, em especial, operam com limitações técnicas e de acesso, o que pode levar a respostas imprecisas ou enviesadas.
Não se trata de algo necessariamente negativo, mas de um alerta: o uso deve ser consciente. A Inteligência Artificial é uma ferramenta de apoio, não um substituto. O seu valor está em ampliar as nossas capacidades, não em anular o pensar, o sentir e o agir humanos.
Para compreender melhor esse fenômeno, fomos conversar com Fábio Giacomelli, santiaguense, Professor de Comunicação na Universidade dos Açores e pesquisador do tema, sobre a popularização da Inteligência Artificial.

GNI: A popularização da Inteligência Artificial traz mais benefícios ou malefícios para a população?
Fábio Giacomelli: Penso que o ponto central está no uso responsável. A IA deve ser vista como uma ferramenta, um auxílio, e não uma muleta. O problema não é usar, mas sim depender. É preciso compreender que a IA nunca deixa o utilizador sem resposta, mesmo quando essa resposta está errada. Isso é um perigo, mas também uma oportunidade. É positivo perder o medo de usar, experimentar, testar. Contudo, não podemos deixar que a máquina substitua a nossa capacidade de pensar, de sentir e de agir. A inteligência artificial é um instrumento, não um fim em si mesma.
GNI: Como percebe esse uso, por exemplo, nas Escolas?
Fábio: Eu costumo dizer que um esperto nunca ganha para sempre. Muitos alunos acreditam que estão a “enganar” os professores ao entregar trabalhos totalmente produzidos por IA. No curto prazo, pode parecer uma vantagem, mas é um engano. Quando chegam as provas, o ENEM, ou qualquer avaliação que depende do raciocínio e do conhecimento assimilado, quem perde é o próprio estudante. O aprendizado não é sobre entregar um texto, mas sobre compreender, refletir e aplicar o conhecimento. A IA pode ajudar, mas não pode aprender por nós.
GNI: E por ser Professor de Jornalismo, como enxerga o uso da Inteligência Artificial pela imprensa, no geral?
Fábio: Ser jornalista é abraçar a complexidade: informar, interpretar, inovar, criar, conectar e transformar realidades. A IA deve ser utilizada, sim. Há situações em que precisamos acelerar certas etapas de pesquisa ou análise para produzir reportagens mais profundas, que façam os cidadãos pensar. Mas não é inovador quem faz tudo com IA. O jornalista inovador é aquele que observa as tendências com espírito crítico, e não como uma moda.
Costumo dizer aos meus alunos que há três coisas que a IA nunca vai alcançar: contexto, verificação de informações e relação com as fontes. Como bem aponta o Professor João Canavilhas, quem opta por substituir o raciocínio humano por algoritmos está a escolher um jornalismo pobre e pouco criativo. Os algoritmos são previsíveis e limitados. A imaginação humana, por outro lado, é rica em emoção, diversidade cultural e criatividade e essas competências socioculturais são inimitáveis.
GNI: Mas é possível perceber quando algum texto jornalístico é feito por IA?
Fábio: Não só possível, como relativamente fácil. A IA tende a repetir padrões: usa estruturas muito semelhantes, expressões previsíveis e, muitas vezes, ignora convenções básicas do jornalismo, como o lead ou a pirâmide invertida. O resultado é um texto prolixo, pouco noticioso e distante da linguagem jornalística. Mesmo detalhes simples, como o uso de emojis ou de travessões, algo que eu pessoalmente gostava de usar, como agora — podem denunciar a origem automatizada.
Acompanho de perto muitos veículos de comunicação, especialmente os que surgiram com as novas plataformas digitais, e posso garantir que há vários textos, inclusive aí em Santiago, claramente produzidos com o auxílio de LLMs.
GNI: E o futuro?
Fábio: Essa é a pergunta de muitos milhões de reais. A história mostra que as tecnologias não se substituem, elas se somam. O rádio não acabou com o jornal em papel, a televisão não acabou com o rádio e a Internet não acabou com nenhuma das mídias de massa. A IA seguirá o mesmo caminho: será plenamente absorvida, ajustada e usada com mais consciência. No futuro, o diferencial será o fator humano. A criatividade, a empatia e o olhar crítico serão o que nos distinguirão das máquinas. Quem souber fazer diferente da IA, vai estar um passo à frente.






























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