"Arbitragem, mas só quando convém." por Fábio Giacomelli
- Saimon Ferreira

- 10 de out.
- 2 min de leitura
Entre a indignação seletiva e o silêncio conveniente, o futebol brasileiro segue refém da hipocrisia

Há quem diga que o futebol é o reflexo da sociedade. E talvez seja mesmo. Porque, assim como no dia a dia, a indignação só aparece quando nos afeta. O resto, a gente finge que não vê. No futebol, chama-se “arbitragem, mas só quando convém”. Quando o erro é contra, é escândalo. Quando é a favor, é “faz parte do jogo”.
Nos últimos dias, vimos dirigentes, jornalistas e torcedores indignados, clamando por justiça, pedindo punições severas e reformas urgentes na arbitragem. Os mesmos que, até ontem, ironizavam a ideia de um conselheiro do Inter em buscar na Justiça o reconhecimento do título de 2005, aquele que foi arrancado depois de uma manipulação feita por árbitros de futebol e apostadores.
O apitador envolvido confessou tudo. Não foi invenção de torcedor. E o ex-presidente do clube que ficou com a taça chegou a ser flagrado em conversa telefónica dizendo que, se o STJD não tivesse anulado os jogos “na canetada”, o campeão de fato e de direito seria o Internacional. Ainda assim, nada mudou. O silêncio, ou pior, o deboche, prevaleceu.
E não foi só em 2005. Algo semelhante, guardadas as proporções, aconteceu em 2020, naquele campeonato que terminou em 2021. O Inter despencou no fim, é verdade, mas todo mundo viu o que se passou nas últimas rodadas. Houve interferência direta e erros em sequência. Mas, novamente, os paladinos da moral desportiva desapareceram. Nenhum pio. Nenhum pedido de revisão. Nenhuma indignação. Nenhuma DVD. Na real, aqui, até concordaram com os tais 18 especialistas internacional que, até hoje, ninguém sabe quem são e que também nunca mais apareceram.
O problema é que a maioria não quer justiça, quer vantagem. Quer que o erro os favoreça. Quando o apito sopra a favor, é “coerência”. Quando vai contra, é “escândalo nacional”. E assim seguimos, num ciclo hipócrita que alimenta o próprio sistema que todos dizem odiar.
Em conversas com amigos, já perdi as contas de quantas vezes fui o primeiro a admitir erros a favor do Inter. Porque quem quer um futebol limpo precisa começar pela honestidade de reconhecer quando o benefício é seu. Mas poucos fazem isso. Poucos têm coragem de olhar para o espelho e admitir que o problema não é o árbitro, é a conveniência.
Há ainda os que só aparecem em certos momentos, quando o assunto está quente, quando dá engajamento ou quando o time deles foi prejudicado. São os “militantes de ocasião” do apito, que passam o resto do campeonato em silêncio. E isso, convenhamos, é o que torna tudo ainda mais engraçado, ou triste, dependendo do ponto de vista.
Enquanto o debate seguir sendo seletivo, nada vai mudar. Continuaremos a ver campeonatos manchados, torcedores desconfiados e árbitros cada vez mais expostos. E, ironicamente, quando o Inter for novamente prejudicado, os mesmos que hoje gritam por justiça estarão aplaudindo o silêncio. Afinal, justiça no futebol brasileiro sempre foi uma questão de conveniência.






























Comentários